Em entrevista para podcast, ministra do Meio Ambiente destacou a posição do governo de iniciar uma transição ecológica no agro
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, reiterou, na semana passada, que o Brasil deve sua condição de potência agrícola à existência da Amazônia. E destacou que o Plano Safra para o ciclo 2023/24, anunciado pelo governo federal, em junho, faz parte do que chamou de “início da transição ecológica da agropecuária brasileira”.
“O Brasil só é uma potência agrícola porque tem a Amazônia. É ela que produz chuva. O melhor uso que podemos fazer da Amazônia é preservar os serviços que ela tem”, disse, em referência à função da floresta, de equilibrar o regime de chuva em outras áreas do país.
Marina fez as declarações em entrevista ao podcast Mano a Mano, apresentado pelo cantor e compositor Mano Brown (Racionais Mc’s), com “consultoria jornalística” e participação da jornalista Semayat Oliveira. O episódio foi veiculado na última quinta-feira (10/8) pela plataforma Spotify.
A ministra afirmou que o Brasil tem condições de duplicar ou até triplicar sua produção sem avançar sobre a floresta amazônica e outras áreas de conservação. E que a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) desenvolveu tecnologias que permitem esse crescimento. É preciso, segundo ela, direcionar corretamente os investimentos.
“Nós temos mais de 17 milhões de hectares, que estão com pecuária improdutiva, com uma cabeça de gado por hectare. Se você investe em aumentar a produção com ganho de produtividade, com tecnologia – não precisa ser intensiva. Pode ser semi-intensiva – dobra a produção sem derrubar uma árvore”, disse, acrescentando que as áreas preservadas, por sua vez, podem ser utilizadas para atividades ligadas ao turismo sustentável ou à bioeconomia.
A ministra reconheceu que a transição ecológica proposta pelo governo não vai acontecer “de uma hora para outra”. Mas a agropecuária precisa ter rastreabilidade e certificação de suas boas práticas ambientais.
“O Plano Safra é a base de transição para uma agricultura de baixo carbono”, disse. “Pegamos o Plano Safra durante seis meses e transformamos, dizendo que, quem não tem boas práticas não vai ter acesso ao crédito”, acrescentou, ressaltando a articulação com os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Carlos Fávaro (Agricultura) nas discussões sobre transição ecológica no Brasil.
Soberania da Amazônia
Marina Silva disse ainda que a soberania sobre a Amazônia é do Brasil. Atribuiu ideias contrárias a invenções de uma “direita primitiva” e a pessoas sem interesse em preservar a floresta.
“A soberania é 100% nossa. O serviço ecossistêmico que ela presta é de toda a humanidade, mas a responsabilidade do cuidado é inteiramente nossa e isso não está em discussão em hipótese nenhuma.”
Para ressaltar a importância dos serviços ecossistêmicos da Amazônia, ela destacou que 75% do Produto Interno Bruto (PIB) da América do Sul estão relacionados com a floresta, que responde por cerca de 20% da água doce que vai para os oceanos.
“São 20 bilhões de toneladas de água por dia sendo bombeadas para chover na América do Sul, no Sul, Sudeste e Centro-oeste. Nós precisaríamos de 50 mil Itaipu Binacional trabalhando ininterruptamente para bombear esse volume. A floresta faz isso de graça. É um serviço ecossistêmico altamente relevante para o planeta”, ressaltou, em referência à hidrelétrica administrada em conjunto por Brasil e Paraguai.
Em sua visão, promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia passa pela integração entre as tecnologias desenvolvidas pela ciência e os saberes tradicionais dos povos da região, como os indígenas.
Segundo a ministra, quem produz na Amazônia apenas “garimpando os nutrientes da floresta” não tem sucesso por muito tempo. E, quando a área se degrada, em vez de recuperá-la, desmata outro local.
“É o que há de mais atrasado”, disse, ponderando que uma parte de produtores na região está se conscientizando.
Ela pontuou que a Amazônia ainda tem “inimigos” que praticam crimes de diversas naturezas, desde ambientais até o uso da região como rota de tráfico de drogas e armas. E acrescentou que é papel do Estado atuar para combater essas práticas de forma constante.
Governo de frente ampla
Durante a entrevista, em que também falou sobre sua trajetória de vida e militância política no Acre, Marina foi questionada sobre sua atual posição no governo Lula e a reaproximação política com o presidente. Ministra do Meio Ambiente em governos anteriores do PT, ela deixou o partido e fundou a Rede Sustentabilidade, pela qual candidatou-se três vezes à Presidência.
A ministra explicou que o apoio ao novo governo envolveu a inclusão de suas propostas à agenda ambiental, como desmatamento zero e a “transversalidade” da política ambiental. Mas reconheceu que Lula – por ter sido eleito com base em uma frente ampla – tem que “administrar contradições” e o diálogo político é difícil.
“Não temos maioria no Congresso. Cada votação é um manejo delicado. Lula está dialogando com uma série de interesses. E a política é a capacidade de dialogar com diferentes interesses legítimos”, ressaltou.