O Conselho Nacional de Justiça promoveu entre os dias 20 e 21, em Campo Grande (MT), o III Simpósio Internacional para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. O objetivo foi avançar no debate e na busca de soluções para combater a impunidade e a invisibilidade desse tipo de crime, caracterizado pelo aliciamento, agenciamento, transporte e alojamento de pessoas mediante ameaça, coação ou fraude, para fins de exploração sexual, trabalho escravo, remoção de órgãos, casamento servil, adoção ilegal, servidão por dívida, ou outra finalidade, em benefício de terceiros. Mulheres, adolescentes, crianças e travestis são os principais alvos das redes de tráfico de pessoas no Brasil, segundo o Ministério da Justiça. São, em sua maioria, pessoas jovens, de baixa renda e pouca escolaridade e acesso a oportunidades de melhoria de vida. Durante o Simpósio, foi apresentada a pesquisa “Tráfico de Mulheres: nova face de uma velha escravidão”, de autoria da advogada e assistente social Tânia Teixeira Laky de Sousa. Segundo a pesquisadora, a feminização da pobreza é o principal motivo de tantas vítimas da rede de tráfico internacional para fins sexuais. “As mulheres vítimas do tráfico são, antes de tudo, vítimas do abandono social, da falta de políticas públicas. Muitas que passaram pela experiência da exploração sexual fora do país preferem não voltar para o Brasil, pois sabem que aqui não encontram perspectiva de trabalho, acompanhamento médico, muito menos acolhimento social ou familiar”. É uma releitura da escravidão, ressalta Tânia Teixeira. Os gastos com alojamento, transporte, alimentação e bebidas, patrocinados pelas redes de tráfico, mantêm estas mulheres endividadas. Assim, precisam fazem uma quantidade desumana de programas, dormem pouco, adoecem, vivem em depressão, tornam-se alcoólatras e viciadas. Quando o corpo não “serve” mais, é descartado sem pena. “Quando conseguem voltar, estão doentes, com AIDS, HPV, mas não recebem tratamento específico. Também faltam casas abrigo para elas. Precisariam de tratamento psicológico. Violência não tratada é violência repetida”, afirma a pesquisadora. Segundo o coordenador-geral do Simpósio, Ney Freitas, o tráfico de pessoas é um atentado contra a humanidade porque “se explora a pessoa, despreza sua honra, além de ameaçar e subtrair sua vida”. Daí a necessidade de sensibilizar juízes e agentes do Direito sobre esse tipo de crime, alertou. “A vítima do tráfico, em geral, já está fragilizada em sua condição socioeconômica. O problema deveria ser tratado como política pública, e o nosso papel é sensibilizar juízes e demais agentes do Direito em relação a esse crime que transforma vidas em mercadorias”. O juiz do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), Rinaldo Aparecido Barros, ressaltou a situação de impunidade com a existência de uma legislação inadequada, geralmente aplicada equivocadamente. “Os criminosos pegam no máximo oito anos e os cumpre em regime semiaberto. Temos de dar nossa resposta como Poder do Estado brasileiro e não ficar na situação de inércia”, salientou. De acordo com levantamento de 14 tribunais estaduais, de 2005 a 2012 foram distribuídos 50 processos judiciais no Brasil envolvendo tráfico interno de pessoas. Desses, apenas 28 seguem em tramitação, um número considerado irreal pelo presidente da Comissão Permanente de Acesso à Justiça e Cidadania, do CNJ, conselheiro Ney Freitas. “O tráfico interno é um crime invisível neste país. Sabemos que o número é muito maior do que o registrado nos processos da Justiça”, afirmou. |
Fonte: Jornal Mulier – www.jornalmulier.com.br
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